ABRUPTO

31.5.06


BIBLIOFILIA: NA FEIRA DO LIVRO



Uma Feira do Livro de Lisboa muito deserta, mas cheia de excelentes livros nos alfarrabistas em contraste com toneladas de lixo nas editoras. Baratos, bastantes (nunca chegam é certo...) e curiosos. Acima de tudo muitas coisas curiosas, que nunca tinha visto. Como esta edição dos navios de guerra do mundo, publicada por Fred T. Jane, o fundador das edições militares de referência. Aqui está, a título de exemplo, a silhueta de um navio turco.

Ao longe no mar, ou no periscópio de um submarino, era assim que se identificava uma amigo ou um inimigo. Depois há uma série de ensaios de C. S. Lewis publicados nos anos cinquenta, que desconhecia e que hoje não estão acessíveis no mercado. Por último, há uma peça de propaganda nazi, editada em 1942 em Berlim e Paris, por uma Sociedade Editora "Europa Lda. "Quando as alcateias dos lobos vermelhos invadiram a Letónia..." o nosso cônsul letão agradece aos alemães salvarem-lhe a vida.

(Continua)

(url)


UMA AVARIA NO BLOGGER



impediu a actualização do Abrupto durante o dia.

(url)


ESTEVE PARA SER UM EARLY MORNING BLOGS

" Look here, Cranly, he said. You have asked me what I would do and what I would not do. I will tell you what I will do and what I will not do. I will not serve that in which I no longer believe whether it call itself my home, my fatherland or my church: and I will try to express myself in some mode of life or art as freely as I can, and as wholly as I can, using for my defence the only arms I allow myself to use.. silence, exile, and cunning."

James Joyce, A Portrait of the Artist as a Young Man

*

Boa noite!

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
O NOVO ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE (2ª série)


Em relação ao assunto "Estatuto da Carreira Docente", vou ficando preocupado à medida que não vejo surgirem reacções de intensidade análogas aquelas que se têm verificado sempre que estão em jogo questões remuneratórias. A ser assim, adensam-se as nuvens sobre a classe. Será que estamos nos carris de uma linha denominada "desde que paguem interessa pouco aquilo que faremos"?

(H. Martins)
*

Espanta-me que se acredite que exista um "lobby de cientistas da educação"...essa denominação nem sequer tem razão de ser! Quando eu era imberbe e loira discutia-se a "unidade versus pluralidade da Psicologia", por culpa do sr. Lagache e das suas ambições de chegar a uma ciência unitária ou de a destruir. Ficou tudo pelo saudável sabor da argumentação.

Já as ditas ciências da educação ou, mais pragmaticamente, os supostos cujos das ditas,... estas/estes, são tão heterogéneos que jamais se uniriam ao ponto de poder criar um grupo de pressão, nem sequer de opinião, quanto mais.... (...)

Agora falar de lobbies? Por favor, meus senhores! Antes existissem, e certamente não seriam da parte das "ciências" da educação. Falta aos professores/investigadores portugueses a cultura da política profissional, à semelhança do que se observa em outros países (vide USA, UK). Continuam demasiado agarrados aos botões e aos tostões para se poderem organizar para além do que concerne à sua pré no final do mês e cultivam a mentalidade sindicalista, pré-movimentos culturais ou de interesses. (...)

Afinal toda a gente sabe de educação, toda a gente (tal como no futebol) se acha conhecedor de quais os remédios milagrosos para tornar os portugueses os mais educados e formados da Europa senão do Mundo e que, só por acaso, são sempre diferentes daqueles que são implementados por seja qual for a força política - oh má sorte, oh fado! Deve ser por má fado que estamos atrás de todos os países recém-chegados à União.

Se os directamente implicados na educação fossem avaliados (não pelos encarregados de educação, valha-nos todos os deuses do olimpo,...esses também teriam que o ser, e a bola de neve não mais acabaria) como qualquer outro profissional do sector empresarial não público, obviamente, talvez as coisas não acontecessem com tanto prejuízo para os seus destinatários.

Irrita-me que sempre que se fala de educação se esqueça quem são os verdadeiros alvos desse sistema pouco eficaz ou sub-avaliado: ou se idolatram as criaturas imbecis e irritantes que mereciam umas boas palmadas dos seus progenitores antes de chegarem à escola ou se vitimizam os pobres meninos cujo destino fica hipotecado pela inépcia da Escola. Que tal uma visão mais realista? Os "pirralhos" são fruto das contingências que lhes oferecemos, sem negar as influências biológicas.

A Escola é apenas e só (e isto singularizando as múltiplas influências que exerce) um dos lugares onde todos temos que passar 9, 12, 16, 18 ou mais anos...é uma vida dentro de uma vida - e se formos honestos todos nos lembramos disso com mais prazer do que desprazer; não é apenas o lugar central, metafórico, das disputas ideológicamente vazias com que todas as forças (fraquezas) políticas deste país resolvem fazer festinhas de faz-de-conta. (...) Estou irritada, sim. Ainda me consigo irritar ao fim de tantos anos de viver aqui - para mim, é sinal de saúde mental. Mal seria se deixasse de rabiar.

Ser profissional no campo da educação não é igual a ser profissional na fabricação do vidro ou na colocação de tijolos - todos sabemos -, mas pode e deve ser avaliado com o mesmo nível de exigência. Não será pela contagem do número de tijolos ou pela qualidade do vidro produzido, mas há muito de cristal na avaliação da educação...exige pureza e quebra-se facilmente.

Tal como sempre achei que os "funcionários" do Governo - ministros, secretários e sub-secretários...para não falar nos directores gerais e sub-directores das empresas públicas -devem ser avaliados, também defendo que todos os outros profissionais o sejam e que daí decorram benefícios ou punições, em função do seu desempenho. Mas se a impunidade vigora a alto-nível como implementar a justiça na base da pirâmide?...enfim...

O problema está em "o que" avaliar , "como" avaliar e por "quem" avaliar. O que é ser um "bom professor", se estes nem sabem ao certo o que é suposto fazer para o ser, e nem quem os manda sabe o que eles devem ser capazes de fazer?...se a avaliação incidisse nas taxas de sucesso (como no plano Roberto Carneiro), era ver a ignorância deste país certificada....Como desempenhar bem a tarefa de docência se esta vai muito para além da mesma e entra muito mais no trabalho maternage/paternage, de secretaria, ou investigação e divulgação (consoante os níveis de ensino)? Então em que moldes o fazer, com que critérios?... E quem tem a competência para avaliar?

Alguém acredita que o caminho da recuperação formativa se faz assombrando e (eventualmente) punindo quem trabalha na área que verdadeiramente faz a diferença face aos novos países da UE? Desiludam-se, ainda nem começou a competição e já estamos atrás.
Que alguma coisa deve ser feita, não tenho dúvidas, mas de que maneira?

Abram a caixinha, mas a Pandora vai fazer muitas vítimas e espero que as primeiras sejam aquelas que resolveram libertar a "bicha".Mas infelizmente sei que não, quem paga são todos "os outros". (...)

(N.M.)
*

Devo, antes de comentar qualquer aspecto relacionado com a proposta ministerial de alteração do ECD, fazer a minha declaração de interesses: Sou professor do 2º Ciclo do Ensino Básico, com 28 anos de serviço e como tal estou no 10º escalão, usufruindo de uma redução da componente lectiva de 8 horas. Como é fácil perceber, estou no topo da carreira e as alterações agora propostas não me afectam em termos de progressão.

Quero no entanto chamar a atenção para o facto de que a ministra se prepara para cumprir a missão para a qual foi nomeada, quando aceitou a pasta da Educação: o objectivo fundamental desta proposta é garantir um congelamento estatutário da progressão na carreira, para o maior número possível de professores. Tudo o resto que se encontra na proposta, do ponto de vista da missão desta ministra, pouco mais é do que folclore, e não me custa a admitir que em sede de negociação, matérias como a avaliação dos professores pelos encarregados de educação, ou outras semelhantes, venham a ser "oferecidas" numa bandeja aos sindicatos.

Porque o essencial é que fique garantido que nos próximos quinze/vinte anos, nenhum dos professores que hoje ainda não se encontra no 9º ou 10º escalão, possa vir a atingir o acesso à categoria de professor titular, e com isso garantir que apenas os actuais professores desses dois escalões atinjam o topo da carreira. Isso na prática irá significar uma estagnação na progressão ao fim de 18 anos para a esmagadora maioria dos actuais e futuros professores, garantindo uma enorme contenção orçamental.

Porque ao contrário do que se apregoa, as preocupações da ministra com a qualidade do ensino, apenas aparecem no discurso porque a central de comunicações do ME acha que isso faz boa imprensa. Senão, como se explicaria que a ministra, tendo identificado como males do sistema as turmas da manhã feitas para os melhores alunos, onde são colocados os filhos de alunos e funcionários, e escolas que se organizam em função de critérios burocrático/administrativos em vez de se preocuparem com o sucesso educativo, não seja consequente com essa avaliação, e não actue sobre os Conselhos Executivos, que são o órgão de gestão que tem a competência de definir projecto educativo e o projecto curricular da escola, o seu regime de funcionamento , organizar as turmas e distribuir o serviço docente.

Cada vez que a ministra e os seus secretários de estado se atiram aos professores, acusando-nos dos males do ensino, fazem-no identificando tarefas e competências mal cumpridas ou negligenciadas pelos Conselhos Executivos. E no entanto não há notícia, mais de um ano após a sua tomada de posse, de qualquer medida correctiva destas más práticas, não dos professores, mas dos órgãos de gestão dos estabelecimentos de ensino.

(Francisco Santos)
*

Não posso deixar de exprimir a minha mais profunda revolta e tristeza pela forma como têm sido os professores tratados. Hoje perante as primeiras páginas dos jornais não posso deixar de sentir revolta. Não vou comentar a necessidade de revisão nem esta revisão. Quero apenas expressar que considero indigno a forma como estrategicamente estas noticias aparecem na comunicação social.

Penso não ter espírito de perseguição. Poderei estar enganado, mas sempre que querem "apertar o papo" aos prof´s a ministra parte para uma "peixeirada" pública que muito diz dos políticos que temos. Sei que não é politicamente correcto dize-lo. Que normalmente isto é dito apenas por "gentinha", mas temos uma ministra que nitidamente não se sabe comportar e temos todos os outros a assistir e a aplaudir. Fala alto, aos berros e tem medo que não lhe obedeçam. Necessita da coação pública. Necessita de denegrir os seus funcionários perante a opinião pública, perante pais e alunos. Como enfrentarão, os professores, amanhã os seus alunos?

Não resisto a fazer um comentário ao estatuto da carreira docente proposto: não promove quem merece. coloca à partida docentes no topo da carreira a avaliar outros possivelmente (quase certo) com mais formação. Teremos Bacharéis a avaliar pessoas doutoradas. Será razoável?

(Carlos Brás)
*

Tinha que ser a pedagogia - com p pequeno - a fazer-me intervir num blog. Apenas para aplaudir a intervenção dos seus co-bloguistas Gabriel Mithá Ribeiro e Joaquim Albano Ferreira Duarte. Morra a pedagogia, morra Pim - com P grande.

(Paulo Freitas)
*

-Como eventual título da secção "funções e tarefas" de um docente, colocaria : MAIS NADA?

-Quanto á secção final (art.111,ponto 2), a coisa parece-me tão GRAVE (principalmente no que se lê implícitamente), que não tenho palavras para quaisquer títulos, pois comecei a sentir algo dentro de mim que me censura a minha humilde inspiração.

(J. A. )

( Professor que está seriamente a pensar em pedir asilo politico a Espanha ou a qualquer outro país, onde me possa ser apenas 1 cidadão que não se sinta a sofucar, dia pra dia ).

(url)


RETRATOS DO TRABALHO EM BUENOS AIRES, ARGENTINA



Operários em trabalhos de manutenção da rede de cabos de uma empresa de televisao de Buenos Aires.

(Francisco F. Teixeira)

Etiquetas:


(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES:
O NOVO ESTATUTO DA CARREIRA DOCENTE
(Actualizado)



Acabo de ler a proposta para o novo Estatuto da Carreira Docente (ECD) e fiquei siderado. Está certo que é uma primeira impressão. Mas o que lá está parece-me excessivamente perigoso. O documento mostra como o PS se rendeu às «Ciências da Educação» e a consequente desvalorização do papel central que os saberes científicos ou académicos específicos deveriam ter no sistema de ensino. A questão da avaliação dos professores pelos encarregados de educação seria um pormenor «acidental» e «removível» se não traduzisse o espírito do documento. Mas traduz. Parece estar a acontecer aquilo que receava do mais perigoso do populismo do governo do Eng.º José Sócrates: ao misturarem-se questões salariais dos docentes com questões «pedagógicas» (mais propriamente ideológicas) da função educativa, inquinaram-se quase irremediavelmente para as próximas décadas as condições para uma reforma de fundo naquilo que é substantivo para o ensino: a relação de sala de aula ou a relação professor-aluno-conhecimento. Não sei se este PS está a reformar o ensino ou a queimar esterilmente o terreno social favorável para a reforma que existia no tempo do Prof. David Justino (por muitas críticas que possam ser dirigidas a esse ex-ministro da educação).

O ECD parece-me anunciar a blindagem das Ciências da Educação dentro do Estado e do sistema de ensino (básico, secundário e superior). Não discutir politicamente a expressão «Ciências da Educação» que consta no Artº 54 da proposta e que confirma a notável conquista da última década de foro de «ciência privilegiada», conquista essa decidida por decreto governativo e não pelo prestígio social assente no valor irrefutável do seu saber, é tomarem-nos por estúpidos. Tirem-se esse tipo de muletas políticas aos cientistas da educação e ver-se-á o que sobra: pouco mais do que um lobby ideologicamente organizado. O problema não é só o que está explícito como o que está implícito em todo o documento.

Como é possível que um lobby (dos «cientistas da educação» ou qualquer outro) tome de assalto o ensino (e o estado) sem que isso gere um verdadeiro, profundo e genuíno debate público sobre quem é ou não dono do pensamento social sobre educação/ensino num país que se auto-referencia como democrático, livre, civilizado? Porque razões o pensamento dito liberal hiberna nestes momentos cruciais? Andaremos nos próximos meses a discutir questões laterais e deixaremos o essencial, como é hábito. O país arrisca-se, uma vez mais, a pagar caro por mais umas décadas este apoio leviano a quem, com a capa de «reformista», nos empurra para o desastre educativo, desta vez com um sorriso de quem disparata escudado numa confortável maioria absoluta. Não me preocupa a questão dos salários dos docentes. O problema é uma ideologia tacanha que, ao não ser combatida, vai persistindo de um modo inacreditável. Será que existe oposição em Portugal? Será que a classe política ligada às questões educativas tem lucidez mínima para avançar com esse tipo de debates? Ou o simples rótulo de «ciência» transforma uma qualquer área do saber em vaca sagrada?

(Gabriel Mithá Ribeiro)
*

Para entender a clarissíma incompetência desta "equipa" ministerial deixo aqui apenas as funções e tarefas exigidas a um docente:


"O docente desenvolve a sua actividade profissional de acordo com as orientações de política educativa e no quadro da formação integral do aluno, cabendo-lhe genericamente:

a) Identificar saberes e competências-chave dos programas curriculares de forma a desenvolver situações didácticas em articulação permanente entre conteúdos, objectivos e situações de aprendizagem, adequadas à diversidade dos alunos;

b) Gerir os conteúdos programáticos, criando situações de aprendizagem que favoreçam a apropriação activa, criativa e autónoma dos saberes da disciplina ou da área disciplinar, de forma integrada com o desenvolvimento de competências transversais;

c) Trabalhar em equipa com professores e outros profissionais, envolvidos nos mesmos processos de aprendizagem;

d) Desenvolver, como prática da sua acção formativa, a utilização correcta da língua portuguesa nas suas vertentes oral e escrita;

e) Assegurar as actividades educativas de apoio e enriquecimento curricular dos alunos, cooperando na detecção e acompanhamento de dificuldades de aprendizagem;

f) Assegurar e desenvolver actividades educativas de apoio aos alunos, colaborando na detecção e acompanhamento de crianças e jovens com necessidades educativas especiais;

g) Utilizar adequadamente recursos educativos variados, nomeadamente as tecnologias de informação e conhecimento, no contexto do ensino e das aprendizagens;

h) Utilizar a avaliação como elemento regulador e promotor da qualidade do ensino, das aprendizagens e do seu próprio desenvolvimento profissional;

i) Participar na construção, realização e avaliação do projecto educativo e curricular de escola;

j) Participar nas actividades de administração e gestão da escola, nomeadamente no planeamento e gestão de recursos;

l) Participar em actividades institucionais, designadamente em serviços de exames e outras reuniões de avaliação;

m) Colaborar com as famílias e encarregados de educação no processo educativo, em projectos de orientação escolar e profissional;

n) Promover projectos de inovação e partilha de boas práticas, com outras escolas, instituições e parceiros sociais;

o) Fomentar a qualidade do ensino e das aprendizagens, promovendo a sua permanente actualização científica e pedagógica apoiado na reflexão e na investigação;

p) Fomentar o desenvolvimento da autonomia dos alunos, respeitando as suas diferenças culturais e pessoais, valorizando os diferentes saberes e culturas e combatendo processos de exclusão e discriminação;

q) Demonstrar capacidade relacional e de comunicação, assim como equilíbrio emocional nas mais variadas circunstâncias;

r) Desenvolver estratégias pedagógicas diferenciadas, promovendo aprendizagens significativas no âmbito dos objectivos curriculares de ciclo e de ano;

s) Assumir a sua actividade profissional, com sentido ético, cívico e formativo;

t) Desenvolver competências pessoais, sociais e profissionais para conceber respostas inovadoras às novas necessidades da sociedade do conhecimento;

u) Promover o seu próprio desenvolvimento profissional, criando situações de autoformação diversificadas, nomeadamente em equipa com outros profissionais, na resolução de problemas emergentes de educativas situações;

v) Avaliar as suas práticas, conhecimentos científicos e pedagógicos e gerir o seu próprio plano de formação.

Ao professor titular são atribuídas, além das previstas no número anterior, as seguintes funções:

a) Coordenação pedagógica do ano, ciclo ou curso;

b) Direcção de centros de formação das associações de escolas;

c) Exercício dos cargos de direcção executiva da escola;

d) Coordenação de departamentos curriculares e conselhos de docentes;

e) Orientação da prática pedagógica supervisionada a nível da escola;

f) Coordenação de programas de desenvolvimento;

g) Exercício das funções de professor supervisor;

h) Participação nos júris das provas nacionais de avaliação de conhecimentos e

competências para admissão na carreira ou da prova de avaliação e discussão

curricular para acesso à categoria."

Repare na quantindade infindável de tarefas e funções a que vão obrigar os docentes (vinte e nove). Repare, ainda na complexidade dos processos envolvidos em cada uma delas.

Levanto apenas três questões:

1. Que ser humano é capaz de cumprir com tal número de tarefas e funções?

2. Que ser humano do mundo ocidental aceita realizar tal número de taferas por mil euros?

3. Quem vai preparar as aulas?

O problema principal da escola pública portuguesa é a insensatez, a profusão de questões ideológicas e a falta de pragmatismo. A escola pública portuguesa, actualmente, não serve ninguém, porque transformou-se num centro de apoio social, de entretenimento e de guarda de crianças e jovens. Tudo isto devido às “ciências” da educação, repare na enorme quantidade de “parasitas” que vivem à custa da escola pública:

Escolas Superiores de Educação;
Faculdades que leccionam licenciaturas em Educação;
Docentes dessas escolas;
“Investigadores” das “ciências” da educação;
Editoras que publicam os textos (todos muito semelhantes e completamente vazios) destes “investigadores”;
Entre outros.

Isto chega ao ponto de se obrigar professores com 3 anos de experiência na formação de jovens e adultos e mais de 8 anos de experiência a leccionar no ensino superior politécnico a fazerem estágio pedagógico! As “ciências” da educação dominam de tal forma a escola pública, que os professores com mais de 6 anos de experiência são obrigados a frequentar uma Escola Superior de Educação para assistirem e serem avaliados a disciplinas como: “Psicologia da Educação”, “Sociologia da Educação”, “Organização Curricular e Avaliação”; “Organização e Gestão Escolar” e finalmente aquela que realmente interessa: “Técnicas pedagógicas”. Para perceber ao ponto a que isto chegou, raramente é leccionada qualquer aula nas quatro disciplinas acima referidas, os alunos é que as leccionam...! Justificação? A legislação está sempre a mudar...!
(...) Se em Portugal não for possível encontrar quem seja capaz de o fazer, que se contrate alguém de fora; porque a escola pública está-se a esvaziar de alunos oriundos das classes média, média alta e alta. Está-se a transformar num centro social para as classes sociais mais desfavorecidas.
(...)

Devido ao teor de todo o texto do novo ECD, à impossibilidade de qualquer ser humano ser capaz de cumprir o exigido e à humilhação a que a classe docente tem estado exposta, pondero seriamente abondar o ensino público português. E, se tal acontecer, tudo farei para deixar de vez este miserável país. Infelizmente, uma boa parte dos docentes das áreas tecnológicas (licenciados em engenharia) com quem tenho conversado, já tomou esta decisão uma vez que não estão para mais vexames públicos.

(..) um docente cansado de tanta insensatez e tanta humilhação pública,

(Carla Maria Fonseca Gouveia)

*

No artº 111 da Proposta de Alteração do Regime Legal da Carreira do Pessoal Docente apresentada pelo Governo este fim de semana, diz-se o seguinte (sublinhados meus):

"1 – O exercício de funções docentes em estabelecimentos de educação ou de ensino

públicos é feito em regime de exclusividade.

2 – O regime de exclusividade implica a renúncia ao exercício de quaisquer outras actividades ou funções de natureza profissional, públicas ou privadas, remuneradas ou não, salvo nos casos previstos nos números seguintes.

3 –É permitida a acumulação do exercício de funções docentes em estabelecimentos de educação ou de ensino públicos com:

a) Actividades de carácter ocasional que possam ser consideradas como complemento da actividade docente;

b) O exercício de funções docentes em outros estabelecimentos de educação ou de ensino."


Eu não percebo muito de leis, mas parece-me que, com este artigo, o Governo pretende dizer aos professores o que eles devem ou não fazer no seu tempo livre e privado. Percebo, por exemplo, que o Governo pretende impedir-me até de fazer trabalho voluntário (já que nem mesmo admite as actividades não remuneradas), coisa que eu faço desde os meus 14 anos! Mas com que direito? E seremos nós, os professores, um balão de ensaio com o objectivo de estender a outros esta vontade de controlar sem limites as vidas dos cidadãos?

(Rui Monteiro, professor de matemática)

*

Não posso deixar de exprimir a minha mais profunda revolta e tristeza pela forma como têm sido os professores tratados. Hoje perante as primeiras páginas dos jornais não posso deixar de sentir revolta. Não vou comentar a necessidade de revisão nem esta revisão. Quero apenas expressar que considero indigno a forma como estrategicamente estas noticias aparecem na comunicação social.

Penso não ter espírito de perseguição. Poderei estar enganado, mas sempre que querem "apertar o papo" aos prof´s a ministra parte para uma "peixeirada" pública que muito diz dos políticos que temos. Sei que não é politicamente correcto dize-lo. Que normalmente isto é dito apenas por "gentinha", mas temos uma ministra que nitidamente não se sabe comportar e temos todos os outros a assistir e a aplaudir. Fala alto, aos berros e tem medo que não lhe obedeçam. Necessita da coacção pública. Necessita de denegrir os seus funcionários perante a opinião pública, perante pais e alunos. Como enfrentarão, os professores, amanhã os seus alunos?

Não resisto a fazer um comentário ao estatuto da carreira docente proposto: não promove quem merece. coloca à partida docentes no topo da carreira a avaliar outros possivelmente (quase certo) com mais formação. Teremos Bacharéis a avaliar pessoas doutoradas. Será razoável?

(Carlos Brás)

*

Julgo que se estará a entrar numa profunda demagogia com esta lista de funções docentes. Obviamente que nenhum professor irá cumprir TODAS essas tarefas. Mas poderá (pela primeira vez) cumprir alguma delas nos seus tempos livres. Finalmente deixaremos de ter professores dispensados da Escola por “ausência de serviço”. Uma situação recorrente em quase todas as Escolas deste País que não é conhecido pelo sucesso das suas escolas e dos seus alunos. Uma situação que permitia às Direcções Escolares (eleitas pelos professores) dar muitos dias de férias aos a quem os elegeu, para além dos devidos por lei. Nomeadamente nos períodos de interrupção das actividades lectivas. Agora, sem prejuízo dos seus horários (de 35 horas), os professores poderão contribuir para a melhoria da sua Escola. Clarifica-se, deste modo, uma questão importante: o que devem fazer os professores na escola…

(Gonçalo Araújo)

*

QUEM SABE FAZ, QUEM NÃO SABE ENSINA, E QUEM NÃO SABE ENSINAR É... «AGENTE EDUCATIVO»

Asseverou-me um amigo biólogo, especialista em espécies autóctones em perigo, que o homo docens, comummente conhecido como professor, se encontra em vias de extinção. Por incapacidade adaptativa às novas exigências ambientais/ profissionais, o professor, isto é, aquele que estuda e ensina, irá, num fósforo, transformar-se numa raridade zoológica. Os seus tropismos adaptativos (estudar , ler, ensinar, pois é!) já não são eficazes, e é vê-lo agora a soçobrar (também de tédio!) nas intermináveis reuniões dos conselhos (pedagógico, de turma, de directores de turma, de departamento, de grupo...), que se transformaram numa morosa (logo)terapia grupal. É vê-lo a arquejar nos labirintos processuais dos projectos/planificações/formações/avaliações, e muitas outras ninhices pedagógico/didácticas, à espera de ser professor, isto é, estudar, ler, ensinar.

(Paulo Ferreira)

*

Os comentários ao Novo Estatuto da Carreira Docente levantam-me preocupação. E preocupam-me porque à falta de substância (tirando o comentário muito pertinente acerca da ingerência na vida privada), optam por criar um manto de dúvidas para criar confusão e medo. Usam-no batendo nas ciências da educação, porque está na moda bater nelas. Como estaria na moda bater na física de Galileu durante o Renascimento ou já esteve na moda bater em muitas outras ciências no seu início. Sim, porque cem anos ou pouco mais não é senão o início de uma ciência. Na informática, mas também nos meios militares e politicos, e em muitos outros, há hoje um nome para isto: ataque por FUD (Fear, uncertainty and doubt).

Critica-se a "quantidade infindável de tarefas e funções" (29), não querendo ver que surgem como requisitos, que não são uma lista para ir marcando de cruz à medida que são feitas... Discussão objectiva é isto: se são muitas, apontem-se as que estão a mais. Como no célebre filme Amadeus, em que perante a sugestão do imperador que a sua música tinha notas a mais, Mozart perguntava então quais devia tirar.

Falam-se em "parasitas" das educação, apontando Escolas Superiores, Faculdades, Docentes, Editores. Então, pergunto: eliminem-se estes actores, e como se forma um professor? Sem sem ensinado por ninguém, sem nada ler? Será que estão a propor que se aprenda a ensinar na lógica "atirem-se à água para nadar"? Aprende-se melhor a nadar na água dentro dela, não a ter aulas teóricas sobre natação, é o que se tenta explicar muitas vezes. Que não é o mesmo que dizer que as aulas teóricas sobre natação não sejam importantes. É apenas dizer que, sendo úteis, não bastam para saber nadar.

Critica-se a "obrigação" de professores com experiência terem de estudar sociologia, psicologia, organização e avaliação, porque o que interessaria seriam apenas as técnicas pedagógicas. É triste ouvir isto. Já agora, tivesse-se a coragem (falo ironicamente) para propor não aprender mais do que o estritamente necessário ao exercício das funções manuais. Francamente! Então ter noções de psicologia, de sociologia, de métodos de avaliação não interessa?!? Porventura são noções óbvias e evidentes, que só porque um professor tem experiência certamente domina?!? De modo algum!! Dou aulas há 7 anos e continuo a procurar mais informação sobre todos estes elementos, não apenas sobre as "técnicas pedagógicas". É como um carpinteiro dizer que só quer saber de cortar madeira, não de economia, não de atendimento a clientes, não de conservação das madeiras em armazém ou depois de entregues os móveis aos clientes...

As ciências da educação, como em qualquer outra área científica emergente, contêm grande valor e grande quantidade de irrelevância ou desinformação. Simplesmente, os professores, que deveriam ter um espírito crítico para avaliar e julgar o que lêem e ouvem, preferem geralmente receber informação doutrinária, "a papinha feita", e assim dá-la (mesmo a nível superior), mais do que ter de assumir uma vida perante conhecimento que, por ser científico, é imperfeito e incerto. É mais difícil receber informação, pensamentos, ideias, conhecimento que apresentem contradições, que possam entrar em contradição com o que se vê e pensa... E tentar resolver essas contradições. É mais fácil dizer "faça-se como sempre que se fez, não tenho de pensar tanto".

Se as ciências da educação em Portugal foram tão más para o Ensino, então porque está a população em geral muito mais bem formada? Proventura esquecem-se as pessoas do que era o ensino no anos 70 e anteriores, da quantidade de pessoas que simplesmente saia do sistema ou era deixada para trás... E que hoje estão na escola. Comparar os poucos (e éramos poucos) que conseguiam prosseguir no sistema de ensino com a globalidade da população que o faz hoje é não apenas cegueira, mas muito perigoso.

(Leonel)

(url)

30.5.06


RETRATOS DO TRABALHO EM FRANKFURT, ALEMANHA



Esta foto foi tirada ontem, no parque de autocarros do aeroporto de Frankfurt Hanh. O motorista de um autocarro aproveitou a pausa entre duas viagens, e o bonito sol que fazia na altura, para colocar os emails em dia.

(Paulo Moreira)

Etiquetas:


(url)

29.5.06


BIBLIOFILIA: ENSAIOS

The image “http://www.fantasticfiction.co.uk/images/x1/x5908.jpg” cannot be displayed, because it contains errors.A Temple of Texts


David Lodge, Consciousness and the Novel : Connected Essays

William H. Gass, A Temple of Texts

Christopher Woodward, In Ruins


(url)


INTENDÊNCIA

Actualizados os ESTUDOS SOBRE COMUNISMO.

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: VÁRIA

SOBRE TIMOR

Na democracia de Timor-Leste há um problema de fundo que ninguém tem falado. Além dos vários problemas sobre o "não respeito das minorias", há este problema de fundo: as únicas eleições que existiram em Timor-Leste, além da Presidência da República, foram para a Assembleia Constituinte, em 2001, organizadas pelas Nações Unidas. Como é normal, em qualquer processo democrático, estava previsto fazer-se as eleições para o Parlamento Nacional de acordo com a nova Constituição.

Com o consentimento de Sérgio Vieira de Melo, a Fretilim, que tinha a maioria absoluta, incluiu uma cláusula na Constituição que diz: Artigo 167 da Constituição de Timor-Leste: «A Assembleia Constituinte transforma-se em Parlamento Nacional com a entrada em vigor da Constituição da República.»

Ou seja, O ACTUAL PARLAMENTO E ACTUAL GOVERNO DE TIMOR-LESTE NÃO RESULTARAM DE ELEIÇÕES.

A intenção seria "evitar despesas" com eleições. No entanto, os partidos mais pequenos, e principalmente os que não têm deputados, estavam à espera das eleições para se afirmarem, ficaram frustrados e nunca "perdoaram" nem aceitaram esta "transformação". Por isso, desde sempre, que esses partidos minoritários têm apoiado manifestações contra o Governo por não ter sido democraticamente eleito, mas "nomeado".

ESTRATÉGIAS PARA ESMAGAR A OPOSIÇÕES

Além da estratégia da Constituição, que "eliminou" qualquer hipótese de oposição, existem outras ameaças:

E o problema mais grave surge porque existem receios (e "ameaças") de várias estratégias para "esmagar" toda e qualquer oposição dentro e fora do partido, utilizando, para o efeito, várias estratégias legislativa formais.

Nas eleições para os Chefes de Sucos, em 2005, à última da hora foi introduzida legislação que inviabiliza a apresentação de candidatos pelos partidos da oposição, por exemplo.

A recente "eleição de braço no ar", no congresso, embora dentro do partido foi mais um indicio que o Governo utiliza todas as estratégias para evitar oposições (como o fez com os chefes de Sucos).

O que a comunidade internacional tem a fazer é vigiar e pressionar para que exista verdadeira democracia, e não democracia formal. Caso contrário, continuarão a surgir tentações totalitárias, estimuladas com o dinheiro do petróleo.

(Marcos)

*

A etnicidade é um combustível ao qual se pode chegar o fogo mas é claro que nem todos - dos mais de 20 grupos etno-linguísticos e das centenas (pelo menos) de clãs - se agregam de forma fácil das duas designações etnicas colectivas: Firaku e kaladi.


Timor é um país mais clãnica do que étnico. Mas isso não melhora a situação.

O problemático desta crise é a de poder ser reduzida - pelo desconhecimento - a uma crise político-institucional (o que parece ser a sua posição) no esquecimento dos problemas socio-culturais. Assim, a reconstrução vai outra vez usar os militares os político e os juristas e esquecer-se das áreas soft da Antropologia e das ferramentas de construção das nações.

(Paulo Castro Seixas)

Fragmento do artigo de Paulo Castro Seixas, "Firaku e Kaladi: Etnicidades Prevalentes nas Imaginações Unitárias em Timor Leste", Trabalhos de Antropologia e Etnologia, vol. 45 (1-2) SPAE, Porto
Em 2001, na altura da campanha eleitoral para a Assembleia Constituinte e Parlamento em Agosto, quando em casa do Francisco (um dos meus interpretes da cultura timorense) com alguns membros da sua família e muitas crianças, visionávamos no LCD da minha câmara um dos comícios em Liquiçá, numa conversa do Francisco com o seu irmão, a certa altura, surge a referência a alguém no comício que é classificado como “Firaku”. Foi neste contexto, já político, que pela primeira vez (apesar de em 2000 já ter efectuado uma estadia de terreno) ouvi este termo. Quando perguntei o que queria dizer “Firaku”, surgiu ali a primeira versão desta história na voz do Francisco com a ajuda do seu irmão e que de seguida parafraseio:

Quando os Portugueses chegaram a Timor, falaram primeiro com os timorenses de Dili. Os timorenses ouviram e ficaram calados. Depois foram para leste e voltaram a falar com os timorenses dali mas neste caso os timorenses simplesmente viraram as costas aos portugueses. E, assim, os calados ficaram “Kaladi” e os que viraram as costas tornaram-se “vira-cus” e depois “Firaku”. Os “Firaku” são os timorenses de Lorosae, de Manatuto para leste e são mais extrovertidos, negociantes e meliantes; os “Kaladi” são os de Loromono, de Manatuto para Oeste e são mais introvertidos, mais perguiçosos, mais consensuais. (Esta foi a versão contada por dois Kaladi).

Apesar de ter regressado a Timor em 2002 e em 2003, só em 2004 (Março-Abril) considerei que era o tempo propício para apalavrar esta questão pois com a entrega da segurança interna e externa ao governo timorense pela UNMISSET teríamos os timorenses entregues a si próprios e às suas diferenças. Portanto, Firaku e Kaladi caracterizariam diferenças entre os timorenses, tal qual foram percebidas pelos portugueses. E tais representações culturais, cuja origem estaria no primeiro “confronto do olhar” dos portugueses com os timorenses, teriam talvez como elemento prévio ou, pelo contrário, ganharam ao longo do tempo, uma densidade étnica na memória e representação actual da sociedade timorense. No entanto, ao longo dos últimos 4 anos de trabalho sobre Timor (com 5 estadias no país de cerca de mês e meio cada) percebi que esta classificação é uma estrutura latente e não é apalavrada nas conversas correntes, pelo menos explicitamente através de tais denominações apesar de fazer parte dos sentidos das conversas, por vezes mesmo antes delas se iniciarem .

*

SOBRE A FUTEBOLÂNDIA


A propósito da futebolândia, Albert Camus, que adorava o futebol, dizia que "os detractores do futebol são tremendos: obrigam-se a falar do futebol" porque a concepção que tinha do jogo encerrava-se nesta asserção:"Ce que finalement, je sais de plus sûr de la morale et des obligations des hommes, c'est au football que je le dois...". É possível que esta visão do jogo constituisse o modelo existencialista corrente e já globalizado nos dois primeiros quarteis do século XX, a ajuizar pelas declarações do então Presidente da Federação Internacional de Futebol, Jules Rimet: "Je suis comme Charles-Quint, le soleil ne se couche jamais sur mon empire". O que é indesmentível.

(João Boaventura)

*

SOBRE O PLANO NACIONAL DE LEITURA

(...) Tenho também algumas dúvidas sobre a eficácia de um Plano Nacional de Leitura uma vez que partilho do ponto de vista do leitor do Abrupto Gabriel Mithá Ribeiro que questiona a legitimidade de tal plano num universo em que nada de fundo é anunciado para aumentar o saber dos alunos, mantendo um nível de complacência geral e acreditando que aulas de substituição e a presença dos professores na escola, para lá das horas de aula (medidas com as quais também eu concordo) resolvem o que quer que seja. Ninguém nunca falou em exigir mais dos alunos: disciplina, aprendizagem e avaliação. Ninguém nunca falou em alterações profundas aos currículos nomeadamente questionando o que se dá, as disciplinas que se impõem aos alunos: eu continuo sem perceber a utilidade de disciplinas como Estudo Acompanhado, Área Projecto e Educação Cívica, esta última então, é de um politicamente correcto absolutamente assustador num universo em que os alunos tem uma literacia baixa, capacidades matemáticas baixas, e sérios problemas de violência (física, verbal, intimidação) e disciplina.

O problema com a leitura e a literacia é um problema social. Não sei, também aqui, como Planos disto ou de aquilo poderão modificar algo de estrutural e tão enraizado como a marginalização da leitura face outras actividades mais imediatamente "gratificantes". Os hábitos de leitura surgem quando a criança, e até o adulto está num ambiente de leitura. Quando têm livros à sua volta, quando vêm os outros, pais, família, amigos, conhecidos a ler. Só se gosta de ler, lendo.

Eu poderia escrever muitíssimo mais sobre este assunto, quer enquanto mãe de filhos em idade escolar, quer enquanto amante de leitura, quer enquanto grande crítica dos currículos escolares cheios de ruído e pouca substância que formam uma sociedade de plástico e tipo Morangos com Açúcar.

(J.)

(url)


EARLY MORNING BLOGS 784

In The Naked Bed, In Plato's Cave


In the naked bed, in Plato's cave,
Reflected headlights slowly slid the wall,
Carpenters hammered under the shaded window,
Wind troubled the window curtains all night long,
A fleet of trucks strained uphill, grinding,
Their freights covered, as usual.
The ceiling lightened again, the slanting diagram
Slid slowly forth.
Hearing the milkman's clop,
his striving up the stair, the bottle's chink,
I rose from bed, lit a cigarette,
And walked to the window. The stony street
Displayed the stillness in which buildings stand,
The street-lamp's vigil and the horse's patience.
The winter sky's pure capital
Turned me back to bed with exhausted eyes.

Strangeness grew in the motionless air. The loose
Film grayed. Shaking wagons, hooves' waterfalls,
Sounded far off, increasing, louder and nearer.
A car coughed, starting. Morning softly
Melting the air, lifted the half-covered chair
From underseas, kindled the looking-glass,
Distinguished the dresser and the white wall.
The bird called tentatively, whistled, called,
Bubbled and whistled, so! Perplexed, still wet
With sleep, affectionate, hungry and cold. So, so,
O son of man, the ignorant night, the travail
Of early morning, the mystery of the beginning
Again and again,
while history is unforgiven.


(Delmore Schwartz)

*

Bom dia!

(url)

28.5.06


RETRATOS DO TRABALHO EM LISBOA, PORTUGAL


Arrumando uma locomotiva em S. Apolónia.

(Carlos Monteiro)

Etiquetas:


(url)

27.5.06


QUEM DESCEU PRIMEIRO AS ESCADAS, O QUE COMERAM AO PEQUENO ALMOÇO, O TORNOZELO QUE ESTÁ VERMELHO, “GOSTAVA DE VIR A PEGAR NELA [A TAÇA]”, “OS RAPAZES VÃO TER UM BOCADO DE PRESSÃO”, “ A ALEMANHA NATURALIZOU FANTASISTAS COMO O NANDO”, “ESTOU NUM GRANDE MOMENTO FÍSICO E PSICOLÓGICO”, “O DESEJO CRESCENTE QUE CADA VEZ MAIS ENVOLVE A NAÇÃO LUSA”, “FAZ FALTA QUARESMA PORQUE FOI MUITO CONSISTENTE”, AS BANCADAS DO LUSITANO ESTÃO SEM LICENÇA. “O DO MEIO TINHA COMO FUNÇÃO FINALIZAR OS CENTROS DA ESQUERDA E DA DIREITA”, MANICHE DEU O “TIRO MAIS SONORO AO POSTE”, OS JOGADORES “MANIFESTARAM SINTONIA”, A CONSTIPAÇÃO INIMIGA DA SELECÇÃO, “COMO TENHO MUITAS SAUDADES DA MINHA MULHER”, “TUDO O QUE FIZER MISTER SCOLARI, ESTÁ BEM”, ETC, ETC.



Ah! minha bela Futebolândia! Segue o exemplo do Montenegro e torna-te independente. Leva a televisão, a rádio e os jornais... Já tens bandeira e hino e a UE dar-te-á seguramente guarida. Deixa o silêncio por cá. Vá, rápido!

(Na Sábado.)

(url)


EARLY MORNING BLOGS 783

Vida


Choveu! E logo da terra humosa
Irrompe o campo das liliáceas.
Foi bem fecunda, a estação pluviosa!
Que vigor no campo das liliáceas!

Calquem. Recalquem, não o afogam.
Deixem. Não calquem. Que tudo invadam.
Não as extinguem. Porque as degradam?
Para que as calcam? Não as afogam.

Olhem o fogo que anda na serra.
É a queimada... Que lumaréu!
Podem calcá-lo, deitar-lhe terra,
Que não apagam o lumaréu.

Deixem! Não calquem! Deixem arder.
Se aqui o pisam, rebenta além.
- E se arde tudo? - Isso que tem?
Deitam-lhe fogo, é para arder...


(Camilo Pessanha)

*

Bom dia!

(url)

26.5.06


RETRATOS DO TRABALHO EM PORTUGAL


Padeiros

Poucos, muito poucos, se lembram, que, quando comem um pedaço de pão ao pequeno almoço, ao almoço ou ao jantar, existe uma actividade muito especifica subjacente à produção de tal alimento. Uma actividade exercida de noite...das 00.00 ás 06.00/07.00, cujo resultado é depois distribuído pelos motoristas ás mercearias, restaurantes, cantinas fabris, escolas, etc...actividade oculta, exercida por homens que não têm mais do que a antiga 4º classe, muitos deles analfabetos, mas que produzem algo (enquanto os outros estão a dormir) que muitas pessoas não dispensa no seu dia a dia: O PÃO!

(Fernando Machado)

(url)


EARLY MORNING BLOGS 782

A Manhã fresca está, sereno o vento,
O monte verde, o rio transparente,
O bosque ameno; e o prado florescente
Fragâncias exalando cento a cento.

O Peixe, a Ave, o Bruto, o branco Armento,
Tudo se alegra; e até sair a gente
Dos rústicos casais se vê contente,
E discorrer com vário movimento.

Este cava, outro ceifa e aquele o gado
Traz no campo a pastar de posto em posto;
Outro pega na fouce, outro no arado.

Tudo alegre se mostra: e só disposto
Tem contra mim o indispensável fado,
Que em nada encontre alívio, em nada gosto.


(Abade de Jazente)

*

Bom dia!

(url)

25.5.06


INTENDÊNCIA

Actualizado O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: LEITURA, LEITURAS.

Actualização em curso dos ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.

(url)


O QUE ESTAVA NA GAVETA

Muitas vezes se perguntou, depois do 25 de Abril, sobre os romances e outros escritos literários que estariam na gaveta sem poderem ser publicados devido à Censura. Hoje sabemos que não havia nada de significativo na gaveta, o que não deixa de ser surpreendente dada a duração da ditadura e o facto de alguns escritores e intelectuais estarem exilados, fora dos constrangimentos policiais do regime, podendo ter escrito textos para além da censura. Se exceptuarmos meia dúzia de poesias, só os textos clandestinos de autores comunistas, os contos "vermelhos" de Soeiro Pereira Gomes e a obra ficcional de Cunhal escrita na cadeia, o Até Amanhã Camaradas e o Cinco Dias, Cinco Noites, foram escritos para além da Censura.

Quer se queira quer não, a Censura exerceu o seu poder muito para além da sua realidade física, mostrando a sua enorme eficácia como instituição, provavelmente, e cada vez me inclino mais para essa avaliação, como a mais poderosa e eficaz instituição da ditadura. O caso português ganha em ser comparado com outros casos de literatura "clandestina", como a produzida pela Resistência francesa, ou pela "dissidência" soviética, onde toda uma tradição literária, poética, ficcional e ensaística, foi mantida sem interrupção, mesmo nos anos mais duros das grandes purgas estalinistas. Nas cozinhas e nas salas dos pequenos apartamentos urbanos, onde poucos cabiam sem se acotovelar, nas dachas periféricas, manuscritos, tiragens frágeis ou apenas a força da memorização mantinham uma vida literária de resistência que nunca o comunismo conseguiu destruir.

Não estando romances, nem novelas, nas gavetas dos nossos escritores da oposição, o que agora se verifica é que estavam cartas. A correspondência torna-se assim a revelação em grande parte por fazer sobre a vida portuguesa subterrânea, que só tenuemente chegava aos jornais e revistas, e que fluía com maior liberdade nas cartas do que nos textos para publicar, embora essa liberdade fosse também vigiada pela PIDE. A correspondência era controlada, as cartas desviadas nos CTT e interceptadas, de forma dirigida ou ao acaso. Várias prisões foram feitas a partir de cartas interceptadas e nas buscas policiais a correspondência era especialmente procurada.

Mas havia correspondência e o pouco que já se conhece mostra a sua importância como fonte ímpar para o conhecimento da época e também, nalguns casos, pelo seu valor literário e ensaístico. A publicação de vários grupos de correspondência, incluindo a de Luiz Pacheco com alguns dos seus companheiros, a excepcional série de cartas entre Óscar Lopes e António José Saraiva é agora acrescentada pela correspondência entre Sophia de Mello Breyner e Jorge de Sena, cobrindo os anos de 1959-1978, editada pela Guerra e Paz. O livro é obrigatório por todas as razões, por Sena, por Sophia e pelo Portugal cultural e político desses anos tristes e convulsos.

Personalidades muito diferentes, Sophia, prudente, calma e contida, e Sena agitado, infeliz e zangado com o mundo, trocam cartas numa época em que as cartas eram ainda importantes e não eram substituídas pelo telefone, cujo uso era escasso, porque caro, para longas distâncias e muito menos pelo inexistente e-mail. Escrever-se era primeiro que tudo um exercício de amizade e é essa a plataforma em que Sena e Sophia se "falam", escrevendo cartas.

De que falam? Do seu mundo, tão diferente em muitos aspectos do actual, a não ser nos comportamentos, e esse mundo é dominado pela literatura, pela política, pela vida pessoal de cada um, em particular quando emanava dos dois temas anteriores. É uma correspondência reservada, pouco íntima, mas que se solta na avaliação de sentimentos, de sentimentos vindos de fora, como as impressões de Sophia sobre o impacto que teve a sua viagem à Grécia.

Falam mais de política do que hoje é habitual, porque a política integrava-se na sua relação cívica e intelectual com o mundo. Nos anos da ditadura, sendo ambos oposicionistas moderados, ou seja não comunistas, a obrigação da política tinha um aspecto de exigência ética que é difícil de compreender nos nossos dias. Nas suas cartas aparece o dilema dos poucos intelectuais portugueses que estavam entalados entre a recusa da ditadura e a desconfiança activa com a hegemonia dos comunistas na cultura da oposição. Quer Sena, quer Sophia relatam vários casos de manipulação dos escritores portugueses pela rede nacional e internacional de apoios, prémios e promoção que favorecia o cânone neo-realista e a fidelidade ideológica em detrimento da qualidade literária. Sena chega a dizer de forma premonitória: "Agora estão os Cidades e os Pimpões contra mim, tempo virá em que os Saraivas se oporão a que eu tenha alguma cátedra" (carta de 1964).

Este isolamento político acentuava as quezílias nos meios literários e, na correspondência, essa eterna característica portuguesa (e não só) é bem retratada, em particular por Sena, que sofria de um enorme ressentimento por não ver o seu valor reconhecido como entendia dever ser. Sena era uma personagem muito mais controversa do que Sophia e as suas atribulações de exílio ainda acentuavam mais a sua permanente zanga com tudo o que era português, melhor, portuguezinho. O peso do exílio é uma constante nas cartas de Sena, que afirmava não "fazer profissão de exilado político inassimilável" e que dizia "comportar-se como brasileiro em tudo", acrescentando depois, com amargura, "sem abdicar em nada de ser o português que ninguém é mais do que eu" (Carta de 1962).

Falando na sua qualidade de poetas, de poeta a poeta, Sophia descreve a impressão que teve na sua viagem à Grécia em 1964: "foi ali a minha total felicidade", "encontrei na Grécia a minha própria poesia (...) encontrei um mundo em que já não ousava acreditar". Na correspondência de Sophia, estas são as páginas mais intensas, e dão, mais tarde, origem a uma discussão entre ambos sobre a tradução, que se percebe ter a ver com "ler" a Grécia. Sophia quer conhecê-la em traduções o mais próximas possível ao original e Sena, então a publicar a sua antologia de traduções, defende a recriação do texto. As traduções tinham um papel no trabalho de ambos porque eram uma das poucas formas de ganhar dinheiro com uma actividade intelectual e criativa, e o dinheiro faltava, em particular, a Sena.

Muito mais se podia escrever sobre esta correspondência, mas basta começar a ler qualquer carta para se perceber a sua importância para conhecer Sena e Sophia, mais o primeiro do que a segunda, e para se perceber o Portugal do século XX, claustrofóbico, pequeno e provinciano. Como Sena escreve, com dureza:

"Cada vez mais penso que Portugal não precisa de ser salvo, porque estará sempre perdido como merece. Nós todos é que precisamos que nos salvem dele."

(No Público de hoje.)

*

NOTA: Fernando Venâncio chama a atenção para que havia mais coisas na gaveta.

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: UM LIVRO PARA ENTENDER OS BALCÃS

The image “http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/f/f3/1943sept17.jpg” cannot be displayed, because it contains errors.Há livros que, de repente, lançam uma grande luz sobre questões que se nos afiguravam difíceis de entender, obscuras ou irracionais. Acabei agora de reler, pela enésima vez, um livrinho do Brigadeiro Fitzroy McLean, (autor, também do “Eastern approaches”) e falecido há alguns anos na sua bela propriedade na Escócia.

O livro, o primeiro que ele escreveu com conhecimento directo de causa (McLean foi o primeiro oficial superior da Inteligência Militar britânica a ser lançado nas montanhas da antiga Jugoslávia, para ser o contacto e o agente de ligação entre os “Partisan” de Tito e o próprio Winston Churchill - que desconfiava, já na altura, dos “Cètniks” de Mihailovic) chama-se “A batalha do Neretva” e os seus primeiros capítulos são, num brilhante resumo, o mais esclarecedor e lúcido documento sobre o que aconteceu na Jugoslávia pós-Tito e em toda a c complicação e sangueira balcânica dos nossos dias.

Quem quiser compreender os conflitos que envolveram a Sérvia, o Kosovo, a Croácia, a Eslovénia e a Bósnia Herzegovina e julgue que conteceram “de repente”, tem naquele livro – escrito em 1948 – tudo o que é preciso, mas mesmo tudo, para adquirir uma perspectiva histórica e à medida que vai lendo, de vez em quando dirá: “...ah! por isso!!!….”; e mais uma dúvida ou perplexidade desaparecerá.

Procurem em alfarrabistas, na Barateira ou encomendem na net (a “Amazon” - amazon.co.uk - é a mais completa e eficiente organização do ramo): “The Battle of the Neretva”, by Brigadier Fitzroy McLean. Vale também a pena ler o “Eastern Approaches”… talvez fiquem a perceber muito do que se passa no Irão e no Iraque.

E já agora, complementarmente, releiam no “Kaput”, do Curzio Malaparte, o capítulo intitulado “a basket of oisters”. Quem, depois disso, se sentir ainda intrigado com os balkans, não perceberá nunca coisa alguma..

(Luiz Rodrigues)


(url)


BIBLIOFILIA / FILATELIA: OBJECTOS EM RISCO DE EXTINÇÃO?


Os catálogos de selos da Afinsa.


E COISAS DA SÁBADO sobre os POBRES SELOS

Que já lhes basta não terem função nos dias de hoje que um computador, uma tira de papel com cola, um carimbo vermelho não substitua e ainda por cima verem-se envolvidos numa possível fraude financeira em que servem de pretexto. Como filatelista amador, os selos são para mim um mundo de prazer e afeição e a Afinsa um bom fornecedor de material filatélico. Registe-se que o que lá compro, trago para casa, e nunca “investi” em selos pelo que não faço parte dos milhares em fila que acreditam em “esquemas” que dão juros imaginários. Não sei se a Afinsa cometia ilegalidades, mas se a firma desaparecer acabam os serviços que quase só ela fornecia: catálogos de qualidade, assinaturas de novidades, folhas de álbuns. Pobres selos, pobres filatelistas que não acreditam em investimentos milagreiros, mas apenas na compulsiva paixão de encher os vazios dos álbuns com história condensada. Sim, porque os selos, principalmente os clássicos, são história condensada.

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: BIBLIOTECAS E ESTÁDIOS

A propósito da "futebolândia" que tanto expôe e critica nos seus escritos remeto-lhe o link de um interessante Blog que contém um trabalho estatístico curioso. Compara-se a média mensal de assistência dos estádios dos dois maiores clubes de Lisboa com o número de visitantes da rede de bibliotecas da capital. Talvez nem tudo esteja perdido......

(Jorge Lopes)

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: LEITURA, LEITURAS

No domingo 21 de Maio a crónica de Vasco Pulido Valente no Público refere-se a um convite que lhe terá sido enviado por três ministros para pertencer à Comissão do Honra do Plano Nacional de Leitura. Afirma ter resolvido responder em público. Mas afinal limita-se a usar o convite como pretexto para um arrazoado de ataques incongruentes e despropositados. Acusa os ministros de lançarem “uma fantasia”, sem se dar ao trabalho de esclarecer o leitor qual é afinal o conteúdo do dito Plano.

Acusa o Dr. Graça Moura, de fazer propaganda ao governo (!) Acusa a televisão, o computador e o telemóvel de impedirem as “criancinhas” de lerem, para afirmar na frase seguinte que afinal nunca se leu tanto em Portugal. Acusa o Miguel Sousa Tavares, a Margarida Rebelo Pinto e o Saramago porque “vendem”livros. Acusa os best-sellers e seus leitores de existirem. Afirma que os hipermercados promovem mais a leitura do que as escolas e as bibliotecas, enfim, não vale a pena continuar a reproduzir o chorrilho de asneiras.

É óbvio que o autor da crónica ignora, (ou quer ignorar?) quais são os resultados dos portugueses nos estudos internacionais de literacia. Bastava-lhe ter lido os jornais na altura da publicação do relatório do PISA 2003, ou consultar a net., para se informar. Se o tivesse feito, poderia verificar que a competência de leitura de 48% dos jovens de 15 anos é mínima. Apenas lhes permite localizar uma informação num texto ou identificar o tema principal do que leram. Um tão baixo nível de domínio da leitura no final do ensino básico exige que se tomem medidas, pois deixa irremediavelmente comprometido o sucesso académico e profissional das novas gerações e impossibilita o desenvolvimento do país. Face a este panorama, considero absolutamente extraordinário, que se possa considerar “inimaginável” a intervenção do Estado, usando como argumento que se deve deixar agir o mercado, ou mais precisamente o “hipermercado”.

Saberá o autor que praticamente todos os países europeus, mesmo os que apresentam resultados bastante favoráveis, lançaram ou estão a preparar medidas de âmbito nacional para desenvolver a literacia? Que países com tradições de intervenção minimalista do Estado nas áreas da Educação e da Cultura (por exemplo o Reino Unido) lançaram planos nacionais e têm apresentado resultados muito positivos? Não leu, não sabe e provavelmente não lhe interessa saber. (...) A mim, como professora, interessa e muito e espero que o governo neste plano siga o bom exemplo inglês que pode ser visto aqui.

(Olívia Cardoso)

*

Ao contrário da minha Colega Olívia Cardoso, fui dos que reagi no PÚBLICO favoravelmente ao texto de Vasco Pulido Valente. Independentemente das especificidades do Plano Nacional de Leitura e do tom veemente do autor, o problema é que esse tipo de planos, certamente “causas nobres” (para usar a expressão de VPV), têm sistematicamente desviado a acção governativa das medidas de fundo que teimosamente continuam a ser adiadas no ensino. Não é “à volta do ensino” que se resolve o problema da literacia, mas dentro do próprio ensino, sem me é permitida a imagem. Para usar uma expressão do Primeiro-Ministro, «Não há volta a dar». Os mesmos governantes que desvalorizam o papel de saberes estruturais para a identidade civilizacional a que pertencemos (a nível literário, científico ou, numa palavra, humanista), através da imposição ou tolerância face a currículos e programas que muitas vezes não revelam mais do que ódio ao conhecimento; os mesmos governantes que se entretêm com as aulas de substituição (com as quais concordo), mas que não mudam nada de substantivo no modelo esgotado de sala de aula e de relação professor-aluno-conhecimento; os mesmos governantes que fingem não entender que a tranquilidade (e mesmo o silêncio) são decisivos para a qualidade das aprendizagens e mantêm uma política de avestruz face aos problemas de indisciplina; os mesmos governantes que pressionam o corpo docente no sentido do facilitismo (por exemplo, incentivando a que a avaliação incida sobre absurdos como as “competências” ou as “atitudes” e cada vez menos sobre a qualidade do que os alunos, de facto, lêem, escrevem ou são capazes de calcular) – tais governantes não têm depois grande legitimidade para, tal qual almas cândidas, virem propor “planos” para corrigir o monstro que deixam arrastar. Admitia legitimidade a tais “planos” se eles viessem complementar políticas de fundo. Mas, lamentavelmente, não é nada disso que está a acontecer. Um outro aspecto que me parece preocupante é que os consensos que tais “planos” bem-intencionados quase invariavelmente geram (tal qual organismos inócuos como o Conselho Nacional de Educação) na prática tendem a apagar a dimensão verdadeiramente política e democrática (e porque não ideológica) do debate educativo. Foi a quase ausência do contraditório, do debate frontal sobre opções ditas «pedagógicas», que fez do ensino aquilo que ele é: o território onde se manifestam, por excelência, efeitos socialmente nefastos do politicamente correcto. Creio que a esse nível, ingleses ou europeus, não nos podem dar grandes exemplos. Há apenas, em benefício deles, uma diferença de grau. Mas o problema é de fundo.

(Gabriel Mithá Ribeiro)

(url)


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(25 de Maio de 2006)


__________________________

Finalmente no Correio da Manhã meia dúzia de perguntas e respostas simples para se perceber o conflito timorense. Mas a pergunta que deve ser feita à nossa comunicação social, que já publicou centenas de milhares de linhas, que já gastou milhões de palavras sobre Timor, que está presente em Timor mais do que em qualquer outro sítio, é por que é que só agora sabemos que existe este conflito étnico com gravidade bastante para desencadear uma guerra civil?

*

Nas paredes do Auditório de um encontro sobre poesia que se deu em Vila do Conde, havia um conjunto de excelentes fotografias dos participantes no encontro anterior, muitas das quais retratos de gente dos blogues. Em Nelson d'Aires podem-se ver essas fotos e muito mais, de um fotografo freelancer que deve ser muito mais conhecido e reconhecido. Não há olhos que vejam?

Peregrinos na transladação da irmã Lúcia.

(url)


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: FORMAS DE TRATAMENTO

Um dos factores reveladores do provincianismo e atraso português é o modo como os jornalistas se dirigem aos treinadores de futebol nas entrevistas e conferências de imprensa, colocando Sr. à frente do nome quando são estrangeiros (Sr. "Co" Adrianse, Sr. Luis Filipe Scolari, Sr. Ronald Koeman) e omitindo-o quando se trata de portugueses (Paulo Bento, António Oliveira, etc). O facto de alguns treinadores portugueses terem sido jogadores de topo e essa maior "familiaridade" (vamos chamar-lhe assim) advir desse facto não serve de justificação, pois muitos também nunca o foram. Podemos verificar a diferença em relação a Inglaterra, onde os jornalistas se dirigem a José Mourinho, que até tem um grau académico, tratando-o, invariavelmente, por José e a Eriksson (seleccionador nacional) por Sven. É óbvio que existem diferenças de "culturas". Trabalhei em multinacionais de influência anglo-saxónica - tratamento pelo 1º nome - e alemã - "Herr" e "Frau" eram a forma mais comum - mas em ambas só por acaso soube o grau académico de alguns dos meus colegas e eles o meu. Mas o que está em causa aqui, numa primeira análise, não é tanto a forma de tratamento, mas sim, no caso focado, a diferenciação desse mesmo tratamento em função da nacionalidade, que, para além do provincianismo que demonstra, pode inclusivamente ocultar, no limite, um comportamento na fronteira da xenofobia, sob a capa, aparente, de um "tom" cerimonioso

(João Cília)

*
Em complemento do que diz João Cília acerca do provincianismo da nossa Futebolândia, recordemos que um clube que é, entre nós, conhecido como «o Milan de Rui Costa» vai ficar sem esse jogador.

Ora, se é verdade, como se diz, que ele vai para o Benfica, como é que o Milan passará a ser referido na comunicação social? E passaremos a ter, em compensação, «o Benfica de Rui Costa»?

(C. Medina Ribeiro)

(url)


EARLY MORNING BLOGS 781

A Noiseless Patient Spider


A noiseless patient spider,
I marked where on a promontory it stood isolated,
Marked how to explore the vacant vast surrounding,
It launched forth filament, filament, filament, out of itself,
Ever unreeling them, ever tirelessly speeding them.

And you O my soul where you stand,
Surrounded, detached, in measureless oceans of space,
Ceaselessly musing, venturing, throwing, seeking the spheres to connect them,
Till the bridge you will need be formed, till the ductile anchor hold,
Till the gossamer thread you fling catch somwhere, O my soul.


(Walt Whitman)

*

Bom dia!

(url)

23.5.06


O ABRUPTO FEITO PELOS SEUS LEITORES: DESTRUIÇÕES EM TACITOLU (TIMOR)



(T.)

(url)

22.5.06


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(22 de Maio de 2006)



__________________________

O debate como luta de gladiadores moderna, e a televisão como sua arena, vista pela publicidade do Prós e Contras na RTP1.

*

Um académico descobre a realidade da selva onde habitamos todos já há muito tempo.

*

Há um grupo de homens para quem os Balcâs não têm nunca novidade: os filatelistas. Independência do Montenegro? Déjà vu:

*
A propósito da sua referência à independência do Montenegro, não tenho deixado de pensar na minha, até agora, única viagem ao país, nos tempos da Jugoslávia de Tito, nos idos de 70 do século passado e, principalmente, na minha visita a Cetinje, antiga capital do país, numa tarde de fim de Verão, ido de Budva, no litoral montenegrino, onde estava de férias. De repente, senti-me transportado a um país irreal, quase como num sonho, ou, melhor ainda, numa recreação fantástica e fantasiada dos tempos do Império, misturando Sissi, o Imperador Francisco José, "O Prisioneiro do Castelo de Zenda" e imagens da Sildávia do Tintin do "Ceptro de Ottokar" com a "modernidade" pronvinciana de uma Jugoslávia "socialista" mas que se pretendia "liberal", que já não era a do litoral turístico mas misturava cenas que poderiam ter sido retiradas do Portugal de província com traços decadentes, principalmente em edifícios, de algum esplendor antigo do Império onde a influência turca era ainda assinalável. Ali, numa pequena cidade de 10.000 habitantes, "enfiada" entre montanhas, onde não esperamos encontrar nada que nos surpreenda, mtº menos estas duas realidades que coexistiam mas se pareciam ignorar e repelir mutuamente. Ainda hoje, quando penso nessa visita, as imagens que ainda retenho mais me parecem retiradas de um sonho ou de uma qualquer recreação fantástica da realidade, do que de algo que tenha efectivamente acontecido.

(João Cília)

(url)


DEZ QUADROS FAUVE NA GALERIA NACIONAL HÚNGARA:

10. OUTUBRO (KAROLY FERENCZY)

October


(url)


EARLY MORNING BLOGS 780

la chanson d'un dadaïste
qui avait dada au coeur
fatiguait trop son moteur
qui avait dada au coeur

l'ascenseur portait un roi
lourd fragile autonome
il coupa son grand bras droit
l'envoya au pape à rome

c'est pourquoi
l'ascenseur
n'avait plus dada au coeur

mangez du chocolat
lavez votre cerveau
dada
dada
buvez de l'eau

(T. Tzara)

*

Bom dia!

(url)

21.5.06


DEZ QUADROS FAUVE NA GALERIA NACIONAL HÚNGARA:

9. RETRATO DE SÁNDOR ZIFFER (VILMOS PERLROTT-CSABA)

http://www.hung-art.hu/kep/p/perlrott/muvek/1/perlr102.jpg

(url)


OS NOVOS DESCOBRIMENTOS: CAMPOS DE PEDRAS

(Em Marte.)

(url)


PERGUNTA RESPONDIDA, TUDO O RESTO ESTÁ EM ABERTO



"A pergunta

O QUE É QUE ACONTECEU AO INQUÉRITO "URGENTE" PARA SABER COMO É QUE LISTAS DE TELEFONES E TELEFONEMAS DE ALTAS INDIVIDUALIDADES DO ESTADO FORAM PARAR AO "ENVELOPE 9" DO PROCESSO CASA PIA?


tem pés para andar, porque é uma exigência cívica. "

Isto foi escrito aqui no dia 19, uma semana depois de a pergunta ter sido formulada e ter sido retomada por vários blogues , assim como em notícias e artigos de opinião nos jornais. No dia 20, o Procurador Geral da República respondia a esta pergunta numa declaração-entrevista no Expresso fornecendo a sua explicação sobre as razões do atraso do inquérito "urgente". Fez bem em explicar o atraso, mesmo que essa explicação comporte opções do Ministério Público na condução do inquérito que são discutíveis na sua oportunidade, necessidade e relevância. Foi, no entanto, ainda mais longe e forneceu informações substantivas sobre o inquérito antes da sua conclusão, que por si só levantam muitas perplexidades e exigem séria discussão. Ela far-se-á, inevitavelmente.

(url)

19.5.06


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(19 de Maio de 2006)



__________________________

A ler: LIBERDADE E UTOPIA no Kontratempos.

*

A pergunta

O QUE É QUE ACONTECEU AO INQUÉRITO "URGENTE" PARA SABER COMO É QUE LISTAS DE TELEFONES E TELEFONEMAS DE ALTAS INDIVIDUALIDADES DO ESTADO FORAM PARAR AO "ENVELOPE 9" DO PROCESSO CASA PIA?


tem pés para andar, porque é uma exigência cívica. Hoje Eduardo Prado Coelho retoma-a no Público:
"Acontece que o mundo mediático tem uma regra (que vai contaminando as diversas áreas da nossa existência): pega num tema, explora-o até à exaustão e depois esquece-o e passa a outro para evitar a saturação dos leitores. E as coisas desaparecem na voragem da memória. E há quem se aproveite destas coisas para continuar a sobreviver na nossa vida pública. Neste caso, estamos perante um verdadeiro escândalo."
*

Mário Crespo na SICN fez a melhor entrevista a Carrilho até agora realizada sobre o seu livro. Com um interlocutor difícil, sem nunca ultrapassar a condição de entrevistador, tendo estudado a matéria e sem preconceitos corporativos, fez perguntas certeiras para as quais não houve resposta cabal. E tirou do livro de José Gil uma interpretação certa, que um filósofo como Carrilho, que também cita Gil a propósito da inveja, perceberá que se lhe aplica. Onde, no seu livro, está "inscrita" a derrota eleitoral de Lisboa?

Cito da entrevista de Gil ao Público, a parte relevante:
P. — É aquilo a que chama "não inscrição". Que significa?

R. — Significa que os acontecimentos não influenciam a nossa vida, é como se não acontecessem. Por exemplo, quando uma pessoa ama, esse sentimento não afectar a outra pessoa, objecto do amor. Quando acabamos de ver um espectáculo, não falarmos sobre ele. Quando muito, dizemos que gostámos ou não gostámos, mais nada. Não tem nenhum efeito nas nossas vidas, não se inscreve nelas, não as transforma. Ainda outro exemplo: o primeiro-ministro, Santana Lopes, classificou a dissolução da Assembleia da República pelo Presidente como "enigmática". Não disse que era incorrecta ou injusta, mas "enigmática", o que é a forma mais eficaz de a transformar em não-acontecimento.

P. — E, não tendo acontecido, ninguém é responsável.

R. — Exactamente. Pode-se continuar como se nada se tivesse passado. Os acontecimentos não se inscrevem em nós, nem nas nossas vidas, nem nós nos inscrevemos na História. Por isso, em Portugal nada acontece.

(url)


DEZ QUADROS FAUVE NA GALERIA NACIONAL HÚNGARA:

8. MULHER TOCANDO VIOLONCELO (ROBERT BERÉNY)



(url)


EARLY MORNING BLOGS 779

Before The World Was Made


If I make the lashes dark
And the eyes more bright
And the lips more scarlet,
Or ask if all be right
From mirror after mirror,
No vanity’s displayed:
I’m looking for the face I had
Before the world was made.

What if I look upon a man
As though on my beloved,
And my blood be cold the while
And my heart unmoved?
Why should he think me cruel
Or that he is betrayed?
I’d have him love the thing that was
Before the world was made.


(William Butler Yeats)

*

Bom dia!

(url)

18.5.06


LENDO / VENDO /OUVINDO
(BLOGUES, JORNAIS, TELEVISÕES, IMAGENS, SONS, PAPÉIS, PAREDES)
(18 de Maio de 2006)



__________________________

Com pés para andar: as "micro-causas", uma invenção cá da casa, tem no Miniscente uma primeira análise substantiva.

And now for something completely different:

O QUE É QUE ACONTECEU AO INQUÉRITO "URGENTE" PARA SABER COMO É QUE LISTAS DE TELEFONES E TELEFONEMAS DE ALTAS INDIVIDUALIDADES DO ESTADO FORAM PARAR AO "ENVELOPE 9" DO PROCESSO CASA PIA?

(url)


A VITÓRIA PÓSTUMA DO XVI GOVERNO CONSTITUCIONAL

Hoje, muita gente que deu o chamado "benefício da dúvida", ou até bem mais do que isso, ao dr. Lopes, abomina-o com vigor... e sem memória. Eu, que nunca lhe dei esse benefício, estou à vontade para ver o pano de fundo em que ele cresceu, e por breves momentos venceu, e perceber que esse pano de fundo está cá bem mais ancorado do que parece. A personagem que o simbolizava "anda por aí", mas o mundo que o criou está bem mais "por aqui" do que muitos querem ver.
http://multimedia.iol.pt/oratvi/multimedia/imagem/id/173761/220
Os sinais desse Portugal estão à vista todos os dias mostrando como só para os outros, para outro Portugal, é que existe a realidade da crise, dos despedimentos, das dificuldades económicas, da perda do poder de compra e da quebra das expectativas. Já sabemos que a indústria das férias tropicais está de vento em popa, como uma breve visita ao aeroporto de Lisboa revela, com as pequenas multidões que partem pálidas e regressam coloridas e com chapéus, sandálias e modismos brasileiros, mexicanos, dominicanos e cubanos. Já sabemos que, ponte sobre ponte, o Algarve se enche de gente com carro e famílias, entupindo as estradas, consumindo uma gasolina que é suposto estar cara, mas que nunca esmoreceu as centenas de quilómetros em direcção ao Sul. Já sabemos que o novo Casino, pérola da governação lisboeta, mil vezes mais eficaz na sua capacidade de existir do que as contrapartidas que foram prometidas para a sua autorização, está cheio de povo, do povo de todas as classes A, B e C, na classificação do marketing. E o povo desloca-se alegre e feliz para os "bandidos com um só braço" que funcionam barato e rápido, deglutindo milhares de moedas, como se elas não faltassem a montante e jusante do Casino. É a "retoma", e quem tinha razão foi quem a anunciou. Lá voltamos ao chefe do XVI Governo Constitucional e à sua omnisciência. Todos estes portugueses nunca passaram pela "toma", estão sempre na "retoma", e folgam como é sua condição.
http://www.fpf.pt/seleccoes/futebol11/masculino/aa/microsites/mundial2006/mundial/imagens/equipa.jpg http://upload.wikimedia.org/wikipedia/en/thumb/e/ec/Vegas_slots.JPG/250px-Vegas_slots.JPG
Mas a vitória póstuma do XVI Governo Constitucional não se limita a ser económico-social, é também cultural. Já dou de barato o futebol, essa "paixão" nacional que tudo faz parar e que tão do agrado era do chefe do XVI Governo Constitucional, ele próprio dirigente e comentador desportivo. Ele sentir-se-á bem com a glória anunciada do escapismo futebolístico, que nos vai encher as casas nos próximos meses, com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma. O Governo, qualquer governo, agradece imenso que haja muito futebol e municia a televisão pública de abundantes fundos para nos encher o ecrã (por falar nisso, já comprou o seu ecrã plano gigante para ver os jogos do Mundial?). Mais vale ver futebol do que pensar no "estado da nação".

Depois há o novo Campo Pequeno, cuja inauguração teve honras de grande espectáculo levado ao país todo pela televisão pública. Se deixássemos o lazer e os brinquedos tecnológicos, podia ser a televisão de Salazar e Caetano a fazer aquela festa. Melhor: podia ser a sociedade do salazarismo a fazer aquela festa. Touros e o mundo dos touros, banda filarmónica tipo Sociedade Imparcial 15 de Janeiro de 1898 de Alcochete (sem desprimor para esta, justa vencedora do 1.º lugar na categoria de Tauromaquia no Concurso de Bandas do Ateneu Vila-franquense), sevilhanas e fados marialvo-toureiro-taurinos, e até o pobre do Lorca, que mais uma vez morreu às cinco em ponto da tarde às mãos de Simone de Oliveira.
The image “http://dn.sapo.pt/2006/04/07/723634.jpg” cannot be displayed, because it contains errors. http://blogue.pelosanimais.org.pt/wp-content/images/tourada.jpg http://photos1.blogger.com/img/182/2300/640/cinha_paulo.jpg
O jet set que se acotovelava para ser entrevistado pela RTP também frequentava os salões do XVI Governo Constitucional. Era o seu mundo "cultural", personificado numa das mais entusiastas e filmadas figuras da bancada da Praça de Touros, Cinha Jardim. Tudo aquilo não foi um vulgar espectáculo, como nos explicavam os entrevistados, mas uma recriação do "Portugal tradicional", mito perdido numas brumas longínquas recuperadas pelos fumos de palco. Como eu sou do Porto, onde não há touros, o único fadista conhecido era o Neca Rafael e o único fado popular era o "já estás com os copos", não me lembro desta "tradição" assim tão portuguesa, mas percebo muito bem o que é que nos querem dizer.

Este mundo tradicional é modernizado para os dias de hoje, pelo espectáculo, em particular por vidas vividas como um reality show. Por isso mesmo, outra vingança póstuma do chefe do XVI Governo Constitucional foi ver uma das suas Némesis, Manuel Maria Carrilho - Némesis idêntica porque ambos fizeram a mesma "política cultural" moldada em Jacques Lang, só que com clientelas distintas -, a não perceber que o mundo lá fora tem ruído e que a imensa imagem que temos de nós próprios não o transforma em espelho. O dr. Lopes viu-se assim com alguém a seguir a sua escola de pensamento sobre a correlação entre derrotas eleitorais e conspirações comunicacionais.
http://inet.sitepac.pt/CarrilhoBarbara01.jpg The image “http://melhorqueprozac.blogs.sapo.pt/arquivo/24horas300704.JPG” cannot be displayed, because it contains errors.
De facto, só a nossa curtíssima memória cívica nos impediu de ver até que ponto é mimético o livro do dr. Carrilho das queixas plangentes do dr. Santana Lopes. O chefe do XVI Governo Constitucional também era lesto em referir conspirações contra ele. Também ele declarou que havia agências de comunicação que eram pagas para o denegrir, assim como nomeava os jornalistas que, por cartão de partido ou conjugalidade, participavam no universal ataque de que se sentia vítima. O mesmo denunciou dezenas de conspirações equivalentes às do vídeo com o pequeno Diniz, desde a fotografia com a banda na cabeça, "fora do contexto", até às peripécias de uma sesta, ou da incompatibilidade da agenda do jet set com a agenda oficial. E não foi ele que ameaçou processar empresas de sondagens porque lhe prometiam resultados eleitorais negativos?

Exemplos absolutamente idênticos abundam. A única diferença é que o chefe do XVI Governo Constitucional nunca gozou da complacência com que o dr. Carrilho é recebido, muito para além da substância igualmente autista do seu livro, com artigos que lhe louvam a "coragem" da denúncia e respeitáveis professores de comunicação a levá-lo a sério, quando nada, insisto nada, é diferente na mecânica do seu livro com as elucubrações do "menino guerreiro".

Ambos demonstram a veracidade do ditado: "Se vives pela imprensa, morres pela imprensa." Quer um quer outro brincaram com um fogo perigoso, o da exposição pública com fins promocionais, ou seja, em política, eleitorais. A vaidade de aparecer corroeu-lhes o ser e, se em Carrilho isso é mais devastador devido à sua indiscutível obra intelectual, iguala-o a Lopes no produto final.

A vitória póstuma do XVI Governo Constitucional ao ver florescer o seu mundo em pleno socialismo não é um epifenómeno. O mesmo Portugal que o fez, desfê-lo como uma personagem do Purgatório de Dante dizia: "Siena mi fé, disfecemi Maremma." Mas desfê-lo para o recriar, desfê-lo porque havia uma eficácia que ele não lhe trazia nem podia trazer: o cenário politicamente mais correcto para o Portugal do dr. Lopes é o de um socialismo manso, que pague o custo retórico do "social" dos pobres, mas que deixe brilhar esse outro "social", o da nossa pobre classe média deslumbrada com expectativas mais caras do que as pode pagar. Foi já assim em Espanha, com Felipe González e os seus novos-ricos. A história é sempre irónica, quando não é trágica.

(No Público de hoje.)

(url)

© José Pacheco Pereira
Site Meter [Powered by Blogger]